28.1.05

A palavra é de prata, o silêncio, de ouro... a palavra em silêncio... de diamante...

27.1.05

As ilusões não duram

Era o silêncio que me fazia esquecer de ti. O silêncio das palavras, das palavras escritas. O silêncio da memória, da apatia. Era o esconder-te dos outros como se negasse um passado, como se cegasse as recordações. Era o nunca falar de ti, o nunca pronunciar o teu nome.
Foi o silêncio que contive durante a nossa relação. Foi o facto de nunca ter contado aos meus amigos da tua existência, foi esse tempo de felicidade que fui contendo, que fui guardando na minha boca feita túmulo. Foi eu esperar que o nosso amor fosse sólido, que fosse inquebrantável e insuspeito. Foi essa ilusão de que iria ser perfeito, de que iria ser único que montou o meu silêncio num teatro sem palco.
Mas o silêncio não durou na tua boca, nem o silêncio nem a ilusão, e uma simples palavra tua despontou uma discórdia que ainda hoje julgava impossível. Uma simples palavra, uma simples faca. Uma adaga que desmontou todo o teu teatro, todo o cenário que montaste numa peça para eu ser o bôbo-das-cortes, o palhaço a que daria corpo e voz de protagonista. Mas eu soube guardar o silêncio na minha boca, guardar o público que necessitavas só para mim. E é nesse silêncio que eu guardo só para mim, nesse silêncio que nunca ousaste compreender, que te fará desvanecer e fundir com a bruma num dia vulgar, num dia tão banal quanto tu.

21.1.05

Mas quem foi que disse que o Mundo gira à volta do sol...? Aquele Copérnico era doido... Na verdade, na verdade... o Mundo gira à volta dos "ses". O que a porcaria de uma conjunção pode mudar...

20.1.05

A verdade mórbida nas palavras...

Sorriste. Sorriste, e bastou um sorriso. A ironia nos teus olhos brilhou sem hesitar, a voz a que me habituei clareou e veio ao meu encontro:
- Acho isso tudo muito exacto. Será que à noite a vida também não escurece? Será que o resto do mundo também não adormece? Como é que sabemos, se estamos a dormir...?
- Já te disse...
- Explica-me outra vez.
E eu recomecei, a nossa história toda de novo, a canção com que te embalava e à relatividade dos sonhos, expliquei-te mais uma vez como tudo não tem de ter um fim pois há coisas que nunca entendemos. Fingias perceber, o olhar sempre fixo na canção que me saía dos lábios, não estávamos sós mas o mundo não existia ali. Nada nos perturbava ou à paz que reflectíamos nesses momentos. Nada que nos importunasse o suficiente os sonhos que desfiávamos a dois, que estragasse a perfeição do nosso paralelismo. Nem eu. Que a vida por vezes dói é um facto, mas que o tempo mata de culpa... quem o explica, agora a mim? Os minutos que passei a contar-te minuciosamente como as coisas acontecem, só para ter o prazer puro de me ouvires e acreditares, as horas que gastámos a olhar o pôr-do-sol, como se dali viesse alguma verdade. A verdade? A verdade, dizias tu, é muito relativa. Ainda me lembro...
- A verdade é muito relativa. Mas sabes o que é pior? É quando o que nos dizem e nos cai mesmo mal é verdade.
- É... - murmurava eu - Há algo de mórbido na verdade das palavras...

16.1.05

A dor de abrir os olhos e ver que tudo continua igual, de perceber que, afinal, as palavras valem mais do que as acções, a dor de te trazer comigo um pouco mais no caminho que nunca chega onde espero, como cansa já ninguém me embalar os sonhos que perdi...
Por que é que a vida me dói assim, por que ninguém me vê nem percebe que tudo o que desfio no papel é o que sinto, ninguém crê, porque é que nem tu, antes tudo (e agora?), vês a sério e acreditas, será possível que ninguém veja como aguento os dias no limite do cansaço enquanto espero pela noite? - estou exausta.
És o único que ainda me olha um pouco da alma, vê-me, ainda que não vejas como me desiludo a cada final (agora já só vejo os finais...), és a única réstia de luz que por (cada vez mais) breves momentos me faz sorrir a sério (já não sei...), por isso peço-te, volto a pedir-te (ainda que não me ouças), despe essa imagem de anjo com que ainda te trago (mesmo agora, que já a sei falsa) se não me vais ajudar, ou estende-me a mão de vez, o melhor que puderes, antes que a tua voz deixe de ser o fio que me ata ainda aos dias, agora que já te disse como a vida me dói - mesmo por nada...
Não te esqueças de mim.

14.1.05

O desafio da verdade

Barbara chamava-lhe o Jogo das 25. Ela gostava muito de brincar, de fingir, de criar brincicadeiras de teatro e encenações de todas as espécies. Mas Barbara detestava a mentira, detestava-a de uma forma quase fóbica, mórbida. De uma forma quase destruidora que por uma vez custou a nossa relação. Barbara detestava a mentira desde que o pai a abandonara durante um fim de semana em que lhe prometera que quando voltasse a levaria a comer um gelado. Barbara nunca mais comeu um. o Jogo das 25 tinha regras simples: cada um de nós tinha direito a 25 perguntas; não valia mentir; podia-se não responder a uma única pergunta. Era um jogo perigoso? Um jogo de vida ou morte? Não, era um jogo de tudo ou nada. E Barbara queria tudo, queria entrar na minha vida, espreitar pela minha alma, estar cá dentro. Metia medo. O mesmo medo que Barbara tinha de mim, do que eu quisesse fazer, do que eu pudesse fazer à sua vida. Barbara queria controlo, da vida dela, da minha, como se eu pudesse sair de cena de um momento para o outro. Tenho pena de só ter chegado às 12 perguntas e de termos interrompido tudo entre beijos e lágrimas que pendiam da face como rios. Tinhamos vinte anos. A primeira pergunta que Barbara me fez foi se eu estava preparado para o desafio da verdade? Eu disse que sim. Menti, não que eu soubesse que mentia, sei-o apenas hoje, dia em que sei que dificilmente alguém estará preparado para a verdade, para a total verdade numa qualquer relação. A mentira faz parte e não sei se é tão mau ser assim. Hoje não tenho coragem de levantar a bandeira da verdade como um valor absoluto. Porquê que não comes gelados? Foi uma das primeiras perguntas que fiz, Barbara contou-me a história toda da relação dela com o pai, de como se sentiu traida, abandonada. As lágrimas humedeceram os seus olhos de amendôa muito claros, quase transparentes. Foi um discurso de quinze minutos da mais alargada franqueza. Quando desafiamos a verdade, até um banal porquê que não comes gelados pode ser dramático. A verdade dói quando tem de doer, e a verdade raras vezes é pacifica. A verdade é um desafio. E uma loucura. Em doze perguntas, em doze perguntas que duraram quatro horas de confissões de peito aberto, onde tudo nos pareceu mágico e nos uniu os corpos, despedaçamos a nossa naturalidade. E tudo ficou condicionado a não nos percebermos mais de tanto que já sabiámos. Como a sábia Barbara disse um dia, passava o resto da vida a tentar descobrir-te de novo, outra vez.

12.1.05

Outro dia que (não) termina com as minhas lágrimas, com esta quase cantiga que cada vez mais me afoga o peito. Não páro de tentar perceber, será que não vês que desespero por deixar, de vez, a existência, que anseio cada vez mais a noite, e não só aquelas que vêm no final dos dias, será que não percebes que a paz que me davas já não me sossega os gritos que solto sempre em vão? Eu caminho sempre mais para onde não possa sentir, eu tento esconder-me nas palavras mas também as palavras têm armadilhas, se eu pudesse, de vez, fechar as asas que já não me servem de nada...
Vejo agora que nunca me olhaste, no fundo, sempre fingiste ver-me e às minhas lágrimas, como me enganei enquanto esperava a tua mão... Espero agora o meu Deus que talvez venha a chegar, é irónico, sempre te pensei o meu anjo, afinal os anjos já não existem, não para mim.
Ninguém vê o final nos meus olhos, ninguém me ouve - não sei como, se grito por dentro o tempo todo!... Eu só espero silêncio, um silêncio qualquer que me venha calar, por fim, o lamento mas não te quero deixar só, não assim, por isso ouve-me, só desta vez (a última?) - leva-me daqui e apressa-me o tempo, faz de anjo por momentos e eu juro que acredito, se me estenderes a mão eu juro que a agarro, atira-me à cara uma paz qualquer, qualquer noite, mas depressa, antes que se me apaguem os dias, que não tenha mais espaço para a minha dor ou que a minha luz se acabe, de vez - não me queiras perder agora.

10.1.05

Saudade

Às vezes tenho saudades de te escrever. De te olhar de papel na mão, os olhos verdes e espertos debruçados sobre um abismo de letras, que te deixavam desamparada. Ora pelo desafio de beleza que as palavras te tentavam, ora pela angústia das palavras mais cruas. Era sempre assim, eu escrevia-te cartas como se a caneta fosse um bisturi que abrisse a alma pelo meio do esterno. As visceras e a pele nas tuas mãos. Às vezes era o teu sorriso tímido entre a mão que levavas à boca, noutras o olhar sério sobre a folha que seguravas directo aos meus olhos, como uma interrogação ou um prenúncio de discussão. Quantas vezes não era um brilho nos olhos, que humedecia e brilhava mais ainda... até cair uma lágrima. Lágrimas de emoção, tinhas lágrimas de emoção nos olhos, e raramente choraste. Isso sim, foi a nossa grande poesia. Às vezes tenho saudades de te ver ler as asneiras da minha imaginação, saudades de abrir a janela da alma, de fazer um diário de coisas que soubeste juntar, guardar folha a folha. Às vezes tenhos saudades de ser quem eu era, de ser quem eu para ti fui.

6.1.05

Quero que saibas que me afogo o tempo todo, que sufoco sob o sorriso que esperas, sempre, ver em mim, que grito sempre que me afasto e da minha boca só ouves a breve despedida, que por trás do olhar que te dirijo, confiante, peço-te ajuda, em desespero, sem que nunca nada te pareça forte o suficiente para te despertar os sentidos, para te mover o socorro que nunca me deste ainda que todo o meu corpo to implore violentamente, por dentro. Quero que saibas que nunca exagerei, que te apercebas da força das minhas palavras ainda que só escritas, nunca conseguiste ver (nunca quiseste?) que me saíam, de facto, do peito, do sítio que ninguém pode conhecer porque é tudo o que tenho que é realmente meu. E quero que saibas, sobretudo, que todas as lágrimas que viste foram verdadeiras e que continuarão a cair, que nem sempre me soubeste estender a mão quando precisei, que me sinto só todos os dias e que nunca vais compreender a lentidão com que apago os dias que me doem mais do que tudo.